sábado, 3 de janeiro de 2009

Impressões

Viver num país diferente do nosso obriga-nos a repensar desde as coisas grandes até aos pequenos detalhes do dia-a-dia. Por coisas grandes entenda-se a nossa identidade, o valor dos afectos, o valor do conhecimento e das experiências, o despertar do olhar e das emoções, que quase se adormecem na presença do que é familiar e a importância daquilo e daqueles que estão ausentes. Os pequenos detalhes começam quando não se pode pedir um café sem que nos tragam uma meia de leite, e um café com uma água com gás torna-se a tal meia-de-leite acompanhada de uma garrafa de meio litro de água com gás, normalmente Vichy. Não, aqui não se pede café e Pedras. Pedi eu mas paguei 5 euros.
Há muitos entraves linguísticos para uma portuguesa a viver em Madrid e os “false friends” são os meus principais inimigos. A mania de que qualquer Português que acrescente um “i” a todas as palavras está a falar espanhol e se consegue fazer entender, é um mito. O que é uma “mierda”. Neste caso o “i” está bem metido. Mas os madrilenos estão habituados a estrangeiros que maltratam a língua e chegam a ser simpáticos, ou condescendentes, e a fazer um esforço para entender.

De irmãos não temos quase nada, mas em Madrid é fácil sentirmo-nos um primo afastado bem recebido numas férias de Verão. Madrid é cosmopolita, agitada, cheia de contrastes e é muito difícil sentirmo-nos aborrecidos ou sem saber o que fazer. Em qualquer parte da cidade, a quase toda a hora, há sempre alguma coisa a acontecer ou algum lugar para visitar. Apesar de trabalhar grande parte do dia, ainda sinto Madrid como turista e não largo o meu guia American Express onde quer que vá. Mas o que dá mesmo muito gozo é ignorar o guia, afastarmo-nos do roteiro turístico e perdermo-nos pelas ruas. Hoje, por acaso, encontrei uma livraria de livros em inglês usados. É de uns americanos que se instalaram há uns anos e combinam num espaço, um tanto degradado mas aconchegante, uma livraria com um bar de tapas que serve brownies. Pelo que vi, parece ser um oásis para onde convergem nativos de países anglófonos. Chama-se J&J e devo lá voltar.
Uma outra coisa que se descobre quando se vive num outro país, é que damos por nós a fazer coisas que nunca tínhamos feito. Hoje, por exemplo, comecei um intercâmbio com uma espanhola. Encontrámo-nos no café mais antigo de Madrid, onde muito da vida intelectual e artística parece ter acontecido, o “Café Comercial”, para trocarmos conhecimentos linguísticos. Eu ensino-lhe inglês e, em troca, a Laura ensina-me espanhol. Pobre coitada ficou com a pior parte. O nível de Inglês dela é bom e podemos falar de arte, literatura, trivialidades, quanto a mim, vamos começar com colher, garfo e afins. A ver… (com pronúncia espanhola)
Fico-me por aqui neste relato de experiências madrilenas. Mas volto.

1 comentário:

João Viegas disse...

Olá!Excelente texto, identifiquei-me completamente com os pormenores. Também eu já andei por espanha, outros tempos. Madrid é sem dúvida uma bela cidade, na minha opinião, fica a perder pra barcelona. Ainda bem que agora é só um problema de língua- os espanhois têm muita pouca apetência pras línguas estrangeiras, o inglês deles é um desastre, deve-se ao facto de durante décadas terem sido um país fechado ao exterior - porque o relacionamento entre o espanhol e tuga, era de desconfiança total,e isso provocava situações muito embaraçosas.Agora tá muito melhor.
Uma coisa que nunca se deve fazer - gostava de dizer isto na cara do Socrates- é falar portunhol, além da figurinha rídicula que poderemos fazer, eles vão continuar a não perceber nada do que dizemos!
boa semana beijo