segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Aqui.Hoje.

Aqui. Hoje.
Jorge Luis Borges

Já somos o esquecimento que seremos.
A poeira elementar que nos ignora
e que foi o ruivo Adão e que é agora
todos os homens e que não veremos.
Já somos na tumba as duas datas
do princípio e do término, o esquife,
a obscena corrupção e a mortalha,
os ritos da morte e as elegias.
Não sou o insensato que se aferra
ao mágico sonido de teu nome:
penso com esperança naquele homem
que não saberá que fui sobre a Terra.
Embaixo do indiferente azul do céu
esta meditação é um consolo.

Aqui fica o link para um texto interessante deste escritor, poeta, tradutor, crítico e ensaísta argentino. (Buenos Aires, 24 de Agosto de 1899Genebra, 14 de Junho de 1986)

www2.fcsh.unl.pt/borgesjorgeluis/textos_borgesjorgeluis/textos5.htm

1 comentário:

Anónimo disse...

Mais um pouco deste poeta que conheci graças a ti....


É o amor. Terei de ocultar-me ou fugir.

Crescem os muros do seu cárcere, como num sonho atroz. A formosa máscara mudou, mas como sempre é a única. De que me servirão meus talismãs: o exercício das letras, a vaga erudição, o aprendizado das palavras que o áspero Norte para cantar seus mares e suas espadas usou, a serena amizade, as galerias da Biblioteca, as coisas comuns, os hábitos, o jovem amor de minha mãe, a sombra militar dos meus mortos, a noite intemporal, o sabor do sonho­?

Estar contigo ou não estar contigo é a medida do meu tempo.

Já o cântaro se quebra sobre a fonte, já o homem se levanta à voz da ave, já escureceram os que olham pelas janelas, mas a sombra nunca trouxe a paz.

É, já sei, o amor: a ansiedade e o alívio de ouvir tua voz, a espera e a memória, o horror de viver no sucessivo.

É o amor com suas mitologias, com suas pequenas magias inúteis.

Há uma esquina pela qual não me atrevo a passar.

Já os exércitos me cercam, as hordas.

(Esta habitação é irreal; ela nunca a viu.)

O nome de uma mulher me delata.

Dói-me uma mulher em todo o corpo.


Jorge Luis Borges (trad. J.A.)